Íntimo do mundo

As palavras soçobram rente ao muro A terra sopra outros vocábulos nus Entre os ossos e as ervas, uma outra mão ténue refaz o rosto escuro doutro poema António Ramos Rosa, in A Nuvem Sobre a Página *** Era assim que eu queria escrever, num instante de luz e sombra, mas não sei fazê-lo. Como … More Íntimo do mundo

Aleg(o)ria

Le plus grand mystère est que nous tirions de nous-mêmes des images assez puissantes pour nier notre néant. A. Malrauz, La condition humaine. Falo melhor quando falo do que gosto, daquilo que já se entranhou dentro de mim e continua a fazer-me descobrir coisas novas, desafios diferentes. Foi o que aconteceu ontem, sem saber bem … More Aleg(o)ria

Albeniz

*** Sevilla, Suite Española, Op. 47 Isaac Albeniz. A Plaza de España era uma das poucas recordações seguras que tinha da primeira visita que fiz a Sevilha aquando da Expo 92. Por isso, a impressão não foi tão forte, apesar da luz, da cor e das formas, esplêndidas e ricas. Construída em meia lua, com um … More Albeniz

“Doze novelas” para as Figuras da Ficção 4: colóquio internacional

***** Uso de deidades, adorações, sacrifícios, entregos da alma, e outros hipérboles introduzidos como licenças poéticas, frases amorosas, e não em verdadeiro sentir, enquanto são gala do dizer e não desvios do sentir católico; isto, e tudo o mais, sujeito à censura da Igreja como filho dela. Gerardo de Escobar, Doze novelas, “Protestação do Autor”. … More “Doze novelas” para as Figuras da Ficção 4: colóquio internacional

Romaria

Costumava ir à romaria com os meus avós. Adorava as barracas, os rituais, os rebanhos à volta da ermida, os ex-votos de cera. A minha avó comprava-me um saco de beijinhos e um conjunto de panelinhas para eu brincar. Merendávamos pão com queijo, bacalhau frito e bolos d’água. O meu avô de olhos verdes, enorme, … More Romaria

Roga pro nobis

Fiquei quieta e baixei a máquina fotográfica. E, no entanto, a luz era perfeita, o enquadramento desenhado milimetricamente. Dei dois passos atrás. Percebi que ela chorava quando vi que os ombros estremeciam, como acontece nos filmes, e quando caíram duas lágrimas, que ela não escondeu, sobre as mãos enroladas no peito. Pareceu-me que ficou muito … More Roga pro nobis

João Gostoso

Falar durante oito horas sobre a poesia de Manuel Bandeira é sempre bom, muito bom. Daqui a pouco dou o primeiro seminário e, sobre a presença dos factos e do quotidiano em Libertinagem, obra de 1930, releio o “Poema tirado de uma notícia do jornal”. Quase sempre os alunos ficam perplexos. Eu só respondo: e por … More João Gostoso

Nuvens de incenso

Pedra e talha. Detalhes que me prendem o olhar no intervalo de uma cerimónia. No altar, o ritual, as mãos levantadas, indicando o caminho aos cânticos e às nuvens de incenso. Os olhos sobem, repetindo o mesmo movimento de ascensão. Devagar. Desenho com os dedos as colunas largas de pedra, as folhas gravadas no pedestal. Sigo … More Nuvens de incenso