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Travel has no longer any charm for me. I have seen all the foreign countries I want to except for heaven and hell, and I have only a vague curiosity as concerns one of those.
Mark Twain, The Complete Letters of Mark Twain, Echo Library, 2007.
Diz Lamartine na sua Voyage en Orient, publicada em 1835:
Il n’y a d’homme complet que celui qui a beaucoup voyagé, qui a changé vingt fois la forme de sa pensée et de sa vie. Les habitudes étroites et uniformes que l’homme prend dans sa vie régulière et dans la monotonie de sa patrie sont des moules qui rapetissent tout. Pensée, philosophie, religion, caractère, tout est plus grand, tout est plus juste, tout est plus vrai chez celui qui a vu la nature et la société de plusieurs points de vue. Si mon esprit s’est agrandi, si mon coup d’œil s’est étendu, si j’ai appris à tout tolérer en comprenant tout, je le dois uniquement à ce que j’ai souvent changé de scène et de point de vue. Étudier les siècles dans l’Histoire, les hommes dans les voyages et Dieu dans la nature, c’est la grande école. Ouvrons le livre des livres; vivons, voyons, voyageons. Le monde est un livre dont chaque pas nous tourne une page; celui qui n’en a lu qu’une, que sait-il?
Pois. Por ser Lamartine, por ser a Voyage en Orient! Façamos justiça a dois viajantes portugueses, dos melhores que eu conheço.
O primeiro é o Padre D. Manuel Caetano de Sousa, clérigo regular, insigne orador e um dos fundadores da Academia Real de História. Quando foi eleito representante da sua comunidade religiosa, a casa de Lisboa dos Clérigos Regulares Teatinos, ao Capítulo Geral da Ordem dos Clérigos Regulares em Roma, da sua longa viagem resultou o manuscrito Viagem de Itália e Espanha, escrita pelo Irmão José Caetano do Avelar que foi seu companheiro nela. É com estas palavras que começa a sua viagem:
Sendo costume dos homens mais advertidos e curiosos, que por qualquer causa fazem viagem, o escrever as memórias delas, me pareceu bem seguir o seu exemplo e dar princípio a minha jornada de Lisboa a Itália, apontando os sucessos delas. (fl. 1)
O segundo é o Padre João Baptista de Castro que, em 1735, escreveu a sua Jornada de Lisboa para Roma. No início do seu diário retomou as palavras de Séneca:
O ir pelo mundo não é a mesma cousa para todos, diz Séneca. Se o homem for sábio, é peregrinação, se for néscio, é desterro. Sapiens peregrinatus, stultus exulat. É peregrinação se for sábio, porque será para ele a mesma peregrinação estado. Pelo contrário, se for néscio, não tirará outro fruto das terras que andar, senão estar fora da pátria, e isto propriamente é desterro.
A disposição para a escrita de viagem, para além da obrigação oficial, implica uma disposição mental que pouco viajantes revelaram da forma mais completa. Poucos passaram da experiência e da memória da viagem ao registo dos seus passos e das suas impressões.
E há quem perca o diário de viagem, como me aconteceu. Ficaram as fotografias de quase dois meses em Roma. Esta a Libreria del Viaggiatore, na Via del Pellegrino, nº 78, uma das minhas preferidas.
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NOTA: o que eu já publiquei sobre o assunto…
“Sob o signo de Mercúrio: jornada de Roma”, Siglo de Oro: Relações hispano-portuguesas no século XVII. Suplemento de Colóquio Letras (178, setembro/dezembro 2011). Lisboa, Setembro de 2011, pp. 128-138; “Itinerários: Frei Bartolomeu dos Mártires, Aldemira e a visitação de Roma”, Limite. Revista de Estudios Portugueses y de la Lusofonía, Cáceres, Universidad de Extremadura, nº 5, 2011, pp. 31-47; “Relação da Corte de Roma: maravilhas da viagem romana”, Revista Portuguesa de Humanidades, Braga, Aletheia/Faculdade de Filosofia, Universidade Católica, 15(2), 2011, pp. 11-32; “Jornada de Roma: narrativas de viagem na época barroca”, in Maria João Marçalo, Maria Célia Lima-Hernandes, Elisa Esteves, Maria do Céu Fonseca, Olga Gonçalves, Ana Luísa Vilela, Ana Alexandra Silva (eds.), Língua Portuguesa: ultrapassar fronteiras, juntar culturas, Universidade de Évora, 2010, pp. 72-93; “Suntuosidad, grandiosidad y exotismo: historias de Roma en el periodo barroco”, in Kazimierz Sabik e Karolina Kumor (eds.), La cultura del barroco espanol e iberoamericano y su contexto europeo, Varsovia, Instituto de Estudios Ibericos e Iberoamericanos de la Universidade de Varsovia, 2010, pp. 103-109; “Diário da Jornada de Roma do Embaixador Extraordinário, o Marquês de Fontes, no ano de 1712”, Máthesis, nº 18, Viseu, 2009, pp. 81-108; “Peregrinações: Roma e Santiago de Compostela”, in Condicionantes culturais da Literatura de Viagens: Estudos e Bibliografias, Lisboa, Cosmos/Centro de Literaturas de Expressão Portuguesa da Universidade de Lisboa, 1999, pp. 83-125 (2ª ed.: 2002).