Saí de casa com a câmera fotográfica, atravessei a estrada, andei dez metros, fotografei o portão em frente, e voltei. Pouco tempo, poucas fotografias. Apenas o suficiente para criar metáforas e metalepses, mundos dentro de outros mundos e entre mundos. Começa a definir-se uma ideia central e acho que cada artigo sobre fotografia deste blogue acentua uma linha que, de forma muitas vezes inconsciente, vou trilhando.
O portão é velho, ninguém dá nada por ele. Mas não desisto de coisas velhas, aparentemente desinteressantes. Faço este exercício algumas vezes; nem sempre resulta, mas não costumo desistir à primeira, mesmo que tenha de apagar todas as fotografias. Desta vez não foi preciso ficar a olhar para o portão durante muito tempo. O desafio foi olhar para além dele e descobrir que luz era aquela que apenas pressentia. E fazer com a câmera fotográfica o fizesse também.
Metáfora fácil, eu sei, e não queria desenvolvê-la porque me parece óbvia, gasta, e eu não tenho nem a agudeza nem a arte dos mestres barrocos para lhe dar novo brilho e nova vida. Apesar disso… por detrás de um portão velho e abandonado havia um mundo de luz, um hortus conclusus, uma imagem abreviada do paraíso. Apetecia-me perguntar à Tatiana Salem Levy onde está a chave deste portão? Eu sei que eu mesma responderia com uma alegoria formal e formalizada: a chave está dentro de ti. Como eu disse, demasiado fácil.
“O desafio foi olhar para além dele e descobrir que luz era aquela que apenas pressentia”… Meus olhos antes fartos de pieguices miméticas da realidade exterior, agora estão deslumbrados diante do que li, do que vi pela fechadura do tempo, e que amei porque me cativou. Parabéns Sara Augusto!
Volte sempre, Adriane. O seu medo das pieguices é também o meu. Uma luta constante! Abraço.