A esta fusão do sublime com os sentidos confusos e ofuscados, da exuberância com as linhas mais puras e límpidas, da beleza mais cristalina com a expressão do sofrimento humano, costumo eu chamar barroco. Como uma aranha enredada na própria teia, uma das teias mais perfeitas da história da arte e da literatura.
Ana de Santa Cruz.
Saí do hotel, andei umas centenas de metros, à procura da sombra nas ruas estreitas e limpas, à procura da cor e da textura dos dias quentes de Sevilha, à procura de novas memórias e de outros sentidos. Tinha dois dias pela frente mas há horas que não querem perder-se de forma alguma e organizam-se sem que eu possa fazer grande coisa. Olhei para o mapa quando cheguei à Plaza del Salvador: Iglesia Colegial del Divino Salvador, a segunda maior igreja de Sevilha.
Mal entrei apeteceu-me sentar e ficar quieta. Mas com uma máquina fotográfica nas mãos, pese a pouca fé nos resultados, só me restava seguir o sentido contrário aos ponteiros do relógio, disparando compulsivamente. Não consigo visitar um espaço por outra ordem, com o sentido certo da forma como se bate um pão de ló. Bem, há na vontade com que como pão de ló muito do meu gosto pelo barroco. Mas adiante.
Acabei por me sentar mesmo, no fim da visita, virada para a imponência do altar mor, já habituada a um discurso diferente do meu registo barroco habitual e que tem a ver com uma escala substancialmente diferente e com pormenores inesperados. Sei que me escapou quase tudo ao olhar, mas o que foi guardado é suficiente para me sentir cheia e satisfeita durante muito tempo. Com o pão de ló não é assim.
Saí a pensar que era apenas o primeiro dia e que haveria muito barroco e muito calor por essa Andaluzia fora.