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Passei por aqui muitos dias da minha vida e em todos eles vi alguma coisa diferente. Acredito que vou pagar um preço alto por não ter experimentado nunca esse estado excelente a que chamam rotina.
Ana de Santa Cruz.
Não gosto muito de fotografias de paisagem, mas também raramente passo tempo com ela. Parece-me sempre demasiado ampla para caber numa fotografia. E acho que a fotografia nunca vai conseguir dizer tudo o que está na paisagem. E depois a paisagem é… paisagem. Nunca me deixa aproximar do detalhe. E nem sempre gosto daquilo que é óbvio.
Há mais de um ano parei na barragem da Aguieira, num dia de sol de dezembro. Consegui chegar até à ponte e foi de lá que fotografei. Estas são as duas fotografias preferidas dessa série. Estavam arrumadas numa pasta que pensei ter perdido. Na primeira gosto da forma como a fotografia constrói um mundo único onde se adivinha o vento sobre a superfície enrugada. O reflexo das nuvens confunde subitamente a perspectiva e obriga-me a ver outra vez. Depois de fazer este exercício com a primeira fotografia tudo parece mais fácil com a segunda. Os arbustos ajudam-me a lê-la melhor. Mas será que eu quero essa leitura mais clara?
Naquele dia, apesar do sol a pique, da luz branca que me deixou ofuscada, obriguei a máquina a semicerrar os olhos e a fazer o que lhe pedia. Revelar as fotografias foi um desafio, lutando contra a demasiada luz. Mas tudo estava lá. Aquele lugar onde passo tantas vezes, sempre diferentes as horas e a luz, é assim. Há dias em que paro. São os dias em que estou mais cansada e preciso de luz.