Estou a acabar mais um artigo sobre os romances da Tatiana Salem Levy. Foi um belo pretexto para rever uma das minhas novelas preferidas de Jorge Amado. O artigo começa assim:
A acreditar-se nos historiadores ibéricos, sejam espanhóis, sejam portugueses, a descoberta das Américas pelos Turcos, que não são turcos coisíssima nenhuma, são árabes de boa cepa, deu-se com grande atraso, em época relativamente recente, no século passado, não antes. (…)
Os primeiros a chegar do Oriente Médio traziam papéis do Império Otomano, motivo por que até nos dias actuais são rotulados de turcos, a boa nação turca, uma das muitas que amalgamadas compuseram e compõem a nação brasileira.
Jorge Amado, A descoberta da América pelos Turcos, Europa-América, 1994, 21 e 26.
O início da pequena novela de Jorge Amado, A descoberta da América pelos Turcos (ou De como o árabe Jamil Bichara, desbravador de florestas, de visita à cidade de Itabuna para dar abasto ao corpo, ali lhe ofereceram fortuna e casamento ou ainda Os esponsais de Adma) levanta uma questão importante para este trabalho que tem a ver com a emigração turca e o facto de estes terem sido vulgarmente confundidos com os árabes, sobretudo sírios e libaneses . Com efeito, não foi por acaso que o escritor baiano ocupou quase todo o primeiro curto capítulo da novela com abundantes referências a esta confusão de origens que acabou por se instituir como definição metonímica. A observação desta «amálgama» ganha contornos de fino humor que se vão repetindo ao longo de Os esponsais de Adma: «Em tudo diferentes um do outro, nada conseguia turvar a amizade dos dois turcos, o sírio e o libanês – eram de nacionalidades fraternas e inimigas» .
A leitura destas considerações «turcas» de Jorge Amado no início deste trabalho, para além da questão levantada, serve para introduzir um dos veios temáticos fundamentais do romance A Chave de Casa, de Tatiana Salem Levy, publicado em Portugal pela Cotovia em 2007. O tema da imigração turca no Brasil implica ter em conta a própria biografia da autora, descendente de judeus turcos e nascida em Lisboa, em 1979, quando, em tempos de repressão política, a família estava exilada em Portugal.
(continua)
Uma opinião sobre “Os turcos de Jorge Amado e de Tatiana Salem Levy”