Domingo à tarde (não, não se trata de Fernando Namora nem de António de Macedo…), um dia lindo, de um sol calmo e leve e quente. Tive de ir ao Centro de Saúde por coisas estranhas que me afligiram e a sala de espera estava cheia. Marquei a consulta e sentei-me. Isto vai demorar… suspirei.
Já fiz muitas coisas na sala de espera de hospitais e centros de saúde: já corrigi exames, já li um número considerável de capítulos do Compêndio Narrativo do Peregrino da América e d’A Preciosa, de Soror Maria do Céu, e muito mais páginas de outros romances; já escrevi cartas, postais e emails; já conversaram comigo e sei a vida completa de algumas pessoas e da sua ascendência até aos bisavôs; já inventei uma vida diferente para mim própria e gostei muito dela e quem a ouviu também se emocionou; já aprendi imenso sobre as doenças mais estranhas para além das mais comezinhas; também já sofri muito na sala de espera, suplicando que me atendessem que eu estava a morrer… Desta vez tinha A chave de Casa, de Tatiana Salem Levy (Cotovia, 2007), para reler e anotar. Mas os bancos, quase de igreja nos anos cinquenta, eram tão desconfortáveis, e as conversas cruzadas eram tantas e tão díspares, que desisti. Arrumei o livro e saí.
Enfim, não sei o que costumam fazer os outros quando esperam para serem atendidos… eu fui buscar a máquina fotográfica e passei uma hora a fotografar as minudências que havia pelo jardim fora. E não eram poucas. Havia uma calçada com ervas bonitas, com rebentos e flores miúdas, muros com musgo verde e amarelo, aquelas plantas espinhosas cheias de maçãzinhas vermelhas, mimosas a rebentar. E uma luz cálida, repousante, que acariciava a terra húmida da chuva que tinha caído na semana anterior. Lembro-me do silêncio, mas não são muitos os ruídos de que dou conta quando estou concentrada a divertir-me.
Não dei conta do passar do tempo. Quando voltei à sala ainda esperei meia hora e só não voltei ao carro para buscar a máquina para fotografar uma velhinha de olhar doce, sentada numa cadeia de rodas, e um puto sardento e com os olhos mais azúis que já vi na vida, porque desisti. Tenho medo de fotografar gente. É gente de uma maneira num minuto; quando apontamos uma máquina fotográfica já não é a mesma gente que observámos antes. Uma inquietação, que me obriga a falar demais, que me deixa aflita, com pressa, para não incomodar…
Esperei duas horas. E depois estive dez minutos com a médica que me garantiu que desta vez também não ia morrer e fui-me embora fotografar para outro sítio, que a luz da tarde estava absolutamente mágica e, de qualquer forma, o trabalho para o artigo que tinha de escrever já estava meio perdido…
A espera nos hospitais e centros de saúde é ridícula… A última vez que fui a um C. Saúde, mandaram-me ir para lá às 15h… só fui atendido perto das 17h30… Ridículo!
Ah, Sara, ainda bem que divides comigo a angústia das salas de espera dos hospitais. Ainda bem que te comovem os olhares à volta. Ainda bem que o tempo entre a saúde e a doença é um muro que andamos à volta dele e por sorte encontramos a saída. Ainda bem que escreves, ainda bem… Amei o texto!